sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

"Seremos saciados com a visão do Verbo"

Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo

(Sermo 194, 3-4: PL 38, 1016-1017) (Séc. V)

Quem poderia conhecer todos os tesouros de sabedoria e ciência ocultos em Cristo e escondidos na pobreza de sua carne? Ele, sendo rico, se fez pobre por nossa causa, a fim de enriquecer-nos com a sua pobreza (cf. 2Cor 8,9). Quando assumiu nossa condição mortal e experimentou a morte, manifestou-se na pobreza; contudo, não perdeu suas riquezas, mas prometeu-as para o futuro.

Como é grande a riqueza de sua bondade, reservada para os que o temem e concedida aos que nele esperam! Agora o nosso conhecimento é imperfeito, até chegar o que é perfeito. Para sermos capazes de alcançá-lo é que o Cristo, igual ao Pai na condição divina, fez-se igual a nós na condição de servo e nos recriou à semelhança divina. O filho único de Deus, tornando-se filho do homem, torna filhos de Deus a muitos filhos dos homens; e promovendo a nossa condição de servos com a sua forma visível de servo, tornou-nos livres e capazes de contemplar a sua forma divina.

Somos filhos de Deus, mas ainda não se manifestou o que seremos! Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque o veremos tal como ele é (1Jo 3,2). Ora, quais são esses tesouros de sabedoria e ciência, para que servem essas riquezas divinas senão para satisfazer a nossa pobreza? Para que essa imensa bondade senão para nos saciar? Mostra-nos o Pai, isto nos basta (Jo 14,8).

E, em certo salmo, um de nós, expressando nossos sentimentos ou falando por nós, diz ao Senhor: Serei saciado quando se manifestar a vossa glória (cf. Sl 16,15 Vulg.). Ele e o Pai são um só; e quem o vê, vê também o Pai. Por conseguinte, o Rei da glória é o Senhor Deus do universo (Sl 23,10). Voltando-se para nós, ele nos mostrará o seu rosto; seremos salvos e saciados, e isso nos bastará.

Mas até que isso aconteça, até mostrar o que nos basta, até bebermos e ficarmos saciados na fonte da vida que é ele mesmo, enquanto caminhamos na fé e peregrinamos longe dele, enquanto temos fome e sede de justiça e desejamos, com indizível ardor, contemplar a beleza de Cristo na sua condição divina, celebremos com amorosa devoção o nascimento de Deus na condição de servo.

Se ainda não podemos contemplar aquele que foi gerado pelo Pai antes da aurora, celebremos o seu nascimento da Virgem no meio da noite. Se ainda não podemos compreender aquele cujo nome subsistirá enquanto o sol brilhar (cf. Sl 71,17), reconheçamos que armou sua tenda ao sol (cf. Sl 18,6).

Se ainda não vemos o Unigênito que permanece no Pai, recordemos o Esposo saindo do quarto nupcial (cf. Sl 18,6). Se ainda não estamos preparados para o banquete do nosso Pai, conheçamos o presépio de nosso Senhor Jesus Cristo.

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