quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Por amor de Cristo, Paulo tudo suportou

Das Homilias de São João Crisóstomo, bispo
(Hom. 2 de laudibus sancti Pauli: PG 50,447-480)
(Séc. IV)

O que é o homem, quão grande é a dignidade da nossa natureza e de quanta virtude é capaz a criatura humana, Paulo o demonstrou mais do que qualquer outro. Cada dia ele subia mais alto e se tornava mais ardente, cada dia lutava com energia sempre nova contra os perigos que o ameaçavam. É o que depreendemos de suas próprias palavras: Esquecendo o que fica para trás, eu me lanço para o que está na frente (cf. Fl 3,13). Percebendo a morte iminente, convidava os outros a comungarem da sua alegria, dizendo: Alegrai-vos e congratulai-vos comigo (Fl 2,18). Diante dos perigos, injúrias e opróbrios, igualmente se alegra e escreve aos coríntios: Eu me comprazo nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições (2Cor 12,10); porque sendo estas, conforme declarava, as armas da justiça, mostrava que delas lhe vinha um grande proveito.
Realmente, no meio das insídias dos inimigos, conquistava contínuas vitórias triunfando de todos os seus assaltos. E em toda parte, flagelado, coberto de injúrias e maldições, como se desfilasse num cortejo triunfal, erguendo numerosos troféus, gloriava-se e dava graças a Deus, dizendo: Graças sejam dadas a Deus que nos fez sempre triunfar (2Cor 2,14). Por isso, corria ao encontro das humilhações e das ofensas que suportava por causa da pregação, com mais entusiasmo do que nós quando nos apressamos para alcançar o prazer das honrarias; aspirava mais pela morte do que nós pela vida; ansiava mais pela pobreza do que nós pelas riquezas; e desejava muito mais o trabalho sem descanso do que nós o descanso depois do trabalho. Uma só coisa o amedrontava e fazia temer: ofender a Deus. E uma única coisa desejava: agradar a Deus.
Só se alegrava no amor de Cristo, que era para ele o maior de todos os bens; com isto julgava-se o mais feliz dos homens; sem isto, de nada lhe valia ser amigo dos senhores e poderosos. Com este amor preferia ser o último de todos, isto é, ser contado entre os réprobos, do que encontrar-se no meio de homens famosos pela consideração e pela honra, mas privados do amor de Cristo.
Para ele, o maior e único tormento consistia em separar-se de semelhante amor; esta era a sua geena, o seu único castigo, o infinito e intolerável suplício. Em compensação, gozar do amor de Cristo era para ele a vida, o mundo, o anjo, o presente, o futuro, o reino, a promessa, enfim, todos os bens. Afora isto, nada tinha por triste ou alegre. De tudo o que existe no mundo, nada lhe era agradável ou desagradável.
Não se importava com as coisas que admiramos, como se costuma desprezar a erva apodrecida. Para ele, tanto os tiranos como as multidões enfurecidas eram como mosquitos. Considerava como brinquedo de crianças os mil suplícios, os tormentos e a própria morte, desde que pudesse sofrer alguma coisa por Cristo.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Vicente venceu naquele por quem o mundo foi vencido

Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo

((Sermo 276,1-2: PL 38,1256 (Séc. V)

A vós foi dado por Cristo não apenas crerdes nele, mas também sofrerdes por causa dele (Fl 1,29), diz a Escritura.
O levita Vicente recebera e possuía um e outro dom. Se não tivesse recebido, como os haveria de possuir? Tinha confiança na palavra, tinha coragem no sofrimento.

Ninguém, portanto, se envaideça de sua força interior, quando fala; ninguém confie nas próprias forças, quando é tentado; porque se falamos bem e com prudência, é de Deus que vem nossa sabedoria e, se suportamos os males com firmeza, é dele que vem a nossa força.
Lembrai-vos de como, no Evangelho, Cristo Senhor adverte os que são seus; lembrai-vos do Rei dos mártires instruindo nas armas espirituais os seus exércitos, exortando-os para a guerra, dando-lhes ajuda e prometendo a recompensa. Ele, que disse aos discípulos: No mundo, tereis tribulações, logo acrescenta, a fim de consolar os medrosos: Mas tende coragem! Eu venci o mundo (Jo 16,33).

Por que então nos admiramos, caríssimos, se Vicente venceu naquele por quem o mundo foi vencido? No mundo, tereis tribulações, diz o Senhor. O mundo persegue, mas não triunfa; ataca, mas não vence. O mundo conduz uma dupla batalha contra os soldados de Cristo: afaga-os para enganá-los, aterroriza-os para quebrá-los. Que o nosso bem-estar não nos preocupe, não nos assuste a maldade alheia, e o mundo está vencido.
Cristo acorre a ambos os combates e o cristão não é vencido. Se neste martírio se considera a capacidade humana para suportá-lo, o fato torna-se incompreensível; mas se nele se reconhece o poder divino, nada há que admirar.

Era tanta a crueldade que afligia o corpo do mártir, e tanta a serenidade que transparecia de sua voz; era tamanha a ferocidade dos suplícios que maltratavam os seus membros, e tamanha a firmeza que ressoava nas suas palavras que, de algum modo maravilhoso, enquanto Vicente suportava o martírio, julgávamos ser torturada outra pessoa diferente da que falava.

E era realmente assim, irmãos, era assim mesmo: era outro que falava. No Evangelho, Cristo prometeu também isto a suas testemunhas, ao prepará-las para tais combates. Falou deste modo: Não fiqueis preocupados como falar ou o que dizer. Com efeito, não sereis vós que havereis de falar, mas sim o Espírito do vosso Pai é que falará através de vós. (Mt 10,19-20).

Por conseguinte, a carne sofria e o Espírito falava; e enquanto o Espírito falava, não apenas era vencida a impiedade, mas também a fraqueza era confortada.

quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Confiança na palavra do Senhor

Salmo 55(56),2-7b.9-14 

Neste salmo se manifesta o Cristo em sua Paixão (S. Jerônimo). 

=2 Tende pena e compaixão de mim, ó Deus, † 
pois há tantos que me calcam sob os pés, * 
e agressores me oprimem todo dia! 
–3 Meus inimigos de contínuo me espezinham, * são numerosos os que lutam contra mim! 

–4 Quando o medo me invadir, ó Deus Altíssimo, * porei em vós a minha inteira confiança. 
=5 Confio em Deus e louvarei sua promessa; † 
é no Senhor que eu confio e nada temo: * 
que poderia contra mim um ser mortal? 

–6 Eles falam contra mim o dia inteiro, * 
eles desejam para mim somente o mal! 
–7b Armam ciladas e me espreitam reunidos, * 
seguem meus passos, perseguindo a minha vida! 

=9 Do meu exílio registrastes cada passo, † 
em vosso odre recolhestes cada lágrima, * 
e anotastes tudo isso em vosso livro. 
=10 Meus inimigos haverão de recuar † 
em qualquer dia em que eu vos invocar; * 
tenho certeza: o Senhor está comigo! 

=11 Confio em Deus e louvarei sua promessa; † 12 é no Senhor que eu confio e nada temo: * que poderia contra mim um ser mortal? 
–13 Devo cumprir, ó Deus, os votos que vos fiz, * e vos oferto um sacrifício de louvor, 

–14 porque da morte arrancastes minha vida * 
e não deixastes os meus pés escorregarem, 
– para que eu ande na presença do Senhor, * 
na presença do Senhor na luz da vida.

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Todos pecaram e estão privados da glória de Deus (Rm 3,23).

Salmo 52(53) 
A insensatez dos ímpios

1 Diz o insensato em seu próprio coração: *
‘Não há Deus! Deus não existe!’
2 Corromperam-se em ações abomináveis, *
já não há quem faça o bem!

3 O Senhor, ele se inclina lá dos céus *
sobre os filhos de Adão,
– para ver se resta um homem de bom senso *
que ainda busque a Deus.

4 Mas todos eles igualmente se perderam, *
corrompendo-se uns aos outros;
– não existe mais nenhum que faça o bem, *
não existe um sequer!

5 Será que não percebem os malvados *
quanto exploram o meu povo?
– Eles devoram o meu povo como pão, *
e não invocam o Senhor.

6 Eis que se põem a tremer de tanto medo, *
onde não há o que temer;
– porque Deus fez dispersar até os ossos *
dos que te assediavam.

– Eles ficaram todos cheios de vergonha, *
porque Deus os rejeitou.
7 Que venha, venha logo de Sião *
a salvação de Israel!

– Quando o Senhor reconduzir do cativeiro *
os deportados de seu povo,
– que júbilo e que festa em Jacó, *
que alegria em Israel!

domingo, 14 de janeiro de 2018

"Vinde e Vede"

Evangelho (Jo1,35-42)
Naquele tempo, 35João estava de novo com dois de seus discípulos 36e, vendo Jesus passar, disse: “Eis o Cordeiro de Deus!” 37Ouvindo essas palavras, os dois discípulos seguiram Jesus.38Voltando-se para eles e vendo que o estavam seguindo, Jesus perguntou: “O que estais procurando?” Eles disseram: “Rabi (que quer dizer: Mestre), onde moras?”39Jesus respondeu: “Vinde ver”. Foram pois ver onde ele morava e, nesse dia, permaneceram com ele. Era por volta das quatro da tarde.40André, irmão de Simão Pedro, era um dos dois que ouviram as palavras de João e seguiram Jesus. 41Ele foi encontrar primeiro seu irmão Simão e lhe disse: “Encontramos o Messias” (que quer dizer: Cristo).42Então André conduziu Simão a Jesus. Jesus olhou bem para ele e disse: “Tu és Simão, filho de João; tu serás chamado Cefas” (que quer dizer: Pedra).

domingo, 7 de janeiro de 2018

"O Senhor deu a conhecer sua salvação ao mundo inteiro"

Dos Sermões de São Leão Magno, papa

(Sermo 3 in Epiphania Domini, 1-3.5: PL 54, 240-244)  (Séc. V)

Tendo a misericordiosa Providência de Deus decidido vir nos últimos tempos em socorro do mundo perdido, determinou salvar todos os povos em Cristo.

Esses povos formam a incontável descendência outrora prometida ao santo patriarca Abraão; descendência gerada não segundo a carne, mas pela fecundidade da fé, e por isso comparada à multidão das estrelas, para que o pai de todos os povos esperasse uma posteridade celeste e não terrestre.

Entrem, pois, todos os povos, entrem na família dos patriarcas, e recebam os filhos da promessa a bênção da descendência de Abraão, à qual renunciaram os filhos segundo a carne. Que todos os povos, representados pelos três Magos, adorem o Criador do universo; e Deus não seja conhecido apenas na Judéia mas no mundo inteiro, a fim de que por toda parte o seu nome seja grande em Israel (Sl 75, 2).

Portanto, amados filhos, instruídos nos mistérios da graça divina, celebremos com alegria espiritual o dia das nossas primícias e do primeiro chamado dos povos pagãos à fé, dando graças a Deus misericordioso que, conforme diz o Apóstolo, nos tornou capazes de participar da luz que é a herança dos santos; ele nos libertou do poder das trevas e nos recebeu no reino de seu amado Filho (Cl 1, 12-13). Pois, como anunciou Isaías, o povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam nas sombras da morte, uma luz resplandeceu (Is 9, 1). E ainda referindo-se a eles, o mesmo profeta diz ao Senhor: Nações que não vos conheciam vos invocarão e povos que vos ignoravam acorrerão a vós (cf. Is 55, 5).

Esse dia, Abraão viu e alegrou-se (Jo 8, 56) ao saber que seus filhos segundo a fé seriam abençoados na sua descendência, que é  Cristo, e ao prever que, por sua fé, seria pai de todos os povos. E deu glória a Deus, plenamente convencido de que Deus tem poder para cumprir o que prometeu (Rm 4, 20-21). Esse dia, também Davi cantou nos salmos, dizendo: As nações que criastes virão adorar, Senhor, e louvar vosso nome (Sl 85, 9). E ainda: O Senhor fez conhecer a salvação, e às nações, sua justiça (Sl 97, 2).

Como sabemos, tudo isto se realizou quando os três Magos, chamados de seu longínquo país, foram conduzidos por uma estrela, para irem conhecer e adorar o Rei do céu e da terra. O serviço prestado por esta estrela nos convida a imitar sua obediência, isto é, servir com todas as forças essa graça que nos chama todos para Cristo.

Animados por esse desejo, amados filhos, deveis empenhar-vos em ser úteis uns aos outros, para que no reino de Deus, aonde se entra graças à integridade da fé e às boas obras, resplandeçais como filhos da luz. Por nosso Senhor Jesus Cristo, que vive e reina com o Pai e o Espírito Santo por todos os séculos dos séculos.

sábado, 6 de janeiro de 2018

Poema para rezar - Quem será tão grande Rei?

Elevai o olhar aos céus
vós que a Cristo procurais.
E da sua eterna glória
podereis ver os sinais.
Essa estrela vence o sol
em fulgor e em beleza,
e nos diz ter vindo à terra
Deus, em nossa natureza.
Da região do mundo persa,
onde o sol tem seu portal,
sábios Magos reconhecem
do Rei novo o sinal.
Quem será tão grande Rei,
a quem astros obedecem,
a quem servem luz e céus
e suas forças estremecem?
Percebemos algo novo,
imortal, superior,
que domina céus e caos
e lhes é anterior.
Rei do povo de Israel,
este é o Rei das gentes,
prometido a Abraão
e à sua raça eternamente.
Ó Jesus, louvor a vós
que às nações vos revelais.
Glória ao Pai e ao Espírito
pelos tempos eternais.

Quem tem o Filho, tem a vida

(1Jo 5,5-13) Primeira Carta de São João.
Caríssimos, 5quem é o vencedor do mundo, senão aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus? 6Este é o que veio pela água e pelo sangue: Jesus Cristo. (Não veio somente com a água, mas com a água e o sangue). E o Espírito é que dá testemunho, porque o Espírito é a Verdade. 7Assim, são três que dão testemunho: 8o Espírito, a água e o sangue; e os três são unânimes.9Se aceitamos o testemunho dos homens, o testemunho de Deus é maior. Este é o testemunho de Deus, pois ele deu testemunho a respeito de seu Filho. Aquele que crê no Filho de Deus tem este testemunho dentro de si. 10Aquele que não crê em Deus faz dele um mentiroso, porque não crê no testemunho que Deus deu a respeito de seu Filho. 11E o testemunho é este: Deus nos deu a vida eterna, e esta vida está em seu Filho. 12Quem tem o Filho, tem a vida; quem não tem o Filho não tem a vida. 13Eu vos escrevo estas coisas a vós que acreditastes no nome do Filho de Deus, para que saibais que possuís a vida eterna.

sexta-feira, 5 de janeiro de 2018

"Seremos saciados com a visão do Verbo"

Dos Sermões de Santo Agostinho, bispo

(Sermo 194, 3-4: PL 38, 1016-1017) (Séc. V)

Quem poderia conhecer todos os tesouros de sabedoria e ciência ocultos em Cristo e escondidos na pobreza de sua carne? Ele, sendo rico, se fez pobre por nossa causa, a fim de enriquecer-nos com a sua pobreza (cf. 2Cor 8,9). Quando assumiu nossa condição mortal e experimentou a morte, manifestou-se na pobreza; contudo, não perdeu suas riquezas, mas prometeu-as para o futuro.

Como é grande a riqueza de sua bondade, reservada para os que o temem e concedida aos que nele esperam! Agora o nosso conhecimento é imperfeito, até chegar o que é perfeito. Para sermos capazes de alcançá-lo é que o Cristo, igual ao Pai na condição divina, fez-se igual a nós na condição de servo e nos recriou à semelhança divina. O filho único de Deus, tornando-se filho do homem, torna filhos de Deus a muitos filhos dos homens; e promovendo a nossa condição de servos com a sua forma visível de servo, tornou-nos livres e capazes de contemplar a sua forma divina.

Somos filhos de Deus, mas ainda não se manifestou o que seremos! Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque o veremos tal como ele é (1Jo 3,2). Ora, quais são esses tesouros de sabedoria e ciência, para que servem essas riquezas divinas senão para satisfazer a nossa pobreza? Para que essa imensa bondade senão para nos saciar? Mostra-nos o Pai, isto nos basta (Jo 14,8).

E, em certo salmo, um de nós, expressando nossos sentimentos ou falando por nós, diz ao Senhor: Serei saciado quando se manifestar a vossa glória (cf. Sl 16,15 Vulg.). Ele e o Pai são um só; e quem o vê, vê também o Pai. Por conseguinte, o Rei da glória é o Senhor Deus do universo (Sl 23,10). Voltando-se para nós, ele nos mostrará o seu rosto; seremos salvos e saciados, e isso nos bastará.

Mas até que isso aconteça, até mostrar o que nos basta, até bebermos e ficarmos saciados na fonte da vida que é ele mesmo, enquanto caminhamos na fé e peregrinamos longe dele, enquanto temos fome e sede de justiça e desejamos, com indizível ardor, contemplar a beleza de Cristo na sua condição divina, celebremos com amorosa devoção o nascimento de Deus na condição de servo.

Se ainda não podemos contemplar aquele que foi gerado pelo Pai antes da aurora, celebremos o seu nascimento da Virgem no meio da noite. Se ainda não podemos compreender aquele cujo nome subsistirá enquanto o sol brilhar (cf. Sl 71,17), reconheçamos que armou sua tenda ao sol (cf. Sl 18,6).

Se ainda não vemos o Unigênito que permanece no Pai, recordemos o Esposo saindo do quarto nupcial (cf. Sl 18,6). Se ainda não estamos preparados para o banquete do nosso Pai, conheçamos o presépio de nosso Senhor Jesus Cristo.

quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Feliz o homem que foi perdoado!

Salmo 31(32)

Davi declara feliz o homem a quem Deus credita a justiça independentemente das obras (Rm 4,6).

–1 Feliz o homem que foi perdoado * e cuja falta já foi encoberta!
=2 Feliz o homem a quem o Senhor † não olha mais como sendo culpado, * e em cuja alma não há falsidade!

=3 Enquanto eu silenciei meu pecado, † dentro de mim definhavam meus ossos * e eu gemia por dias inteiros,

–4 porque sentia pesar sobre mim * a vossa mão, ó Senhor, noite e dia;
– e minhas forças estavam fugindo, * tal como a seiva da planta no estio.

–5 Eu confessei, afinal, meu pecado, * e minha falta vos fiz conhecer.
– Disse: 'Eu irei confessar meu pecado!' * E perdoastes, Senhor, minha falta.

–6 Todo fiel pode, assim, invocar-vos, * durante o tempo da angústia e aflição,
– porque, ainda que irrompam as águas, * não poderão atingi-lo jamais.

–7 Sois para mim proteção e refúgio; * na minha angústia me haveis de salvar,
– e envolvereis a minha alma no gozo * da salvação que me vem só de vós.

=8 'Vou instruir-te e te dar um conselho; † vou te dar um conselho a seguir, * e sobre ti pousarei os meus olhos:

=9 Não queiras ser semelhante ao cavalo, † ou ao jumento, animais sem razão; * eles precisam de freio e cabresto
– para domar e amansar seus impulsos, * pois de outro modo não chegam a ti'.

=10 Muito sofrer é a parte dos ímpios; † mas quem confia em Deus, o Senhor, * é envolvido por graça e perdão.

=11 Regozijai-vos, ó justos, em Deus, † e no Senhor exultai de alegria! * Corações retos, cantai jubilosos!

"A vida da família cristã"

Da Carta de São Paulo aos Colossenses 3,17–4,1

Irmãos: Tudo o que fizerdes, em palavras ou obras, seja feito em nome do Senhor Jesus Cristo. Por meio dele dai graças a Deus, o Pai.
Esposas, sede solícitas para com vossos maridos, como convém, no Senhor. Maridos, amai vossas esposas e não sejais grosseiros com elas. Filhos, obedecei em tudo aos vossos pais, pois isso é bom e correto no Senhor. Pais, não intimideis os vossos filhos, para que eles não desanimem. Servos, obedecei em tudo a vossos senhores segundo a carne, não servindo apenas diante de seu olhos, como quem procura agradar aos homens, mas com simplicidade de coração, por temor do Senhor. Tudo o que fizerdes, fazei-o de coração, como para o Senhor e não para os homens. Pois vós bem sabeis que recebereis do Senhor a herança como recompensa. Servi a Cristo, o Senhor! Quem pratica o mal receberá o devido castigo, sem distinção de pessoa.
Quanto a vós, senhores, dai aos vossos servos o que é justo e adequado, sabendo que também vós tendes um Senhor no céu.

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

"O duplo preceito da caridade"

Do Tratado sobre o Evangelho de São João, de Santo Agostinho, bispo

(Tract. 17, 7-9: CCL 36, 174-175)   (Séc. V)

Veio o Senhor, mestre da caridade, cheio de caridade, cumprir prontamente a palavra sobre a terra (cf. Rm 9,28 Vulg.), como dele foi anunciado, e sintetizou a lei e os profetas nos dois preceitos da caridade.

Recordai comigo, irmãos, quais são esses dois preceitos. É preciso que os conheçais profundamente, de tal modo que não vos venham à mente só quando vo-los lembramos, mas os conserveis sempre bem gravados em vossos corações. Recordai-vos em todo momento de que devemos amar a Deus e ao próximo: a Deus de todo o nosso coração, de toda a nossa alma, e de todo o nosso entendimento; e ao próximo como a nós mesmos (cf. Mt 22,37-39).

Esses dois preceitos devem ser sempre lembrados, meditados, conservados na memória, praticados, cumpridos. O amor de Deus ocupa o primeiro lugar na ordem dos preceitos, mas o amor do próximo ocupa o primeiro lugar na ordem da execução. Pois, quem te deu esse duplo preceito do amor não podia ordenar-te amar primeiro ao próximo e depois a Deus, mas primeiramente a Deus e depois ao próximo.

Entretanto, tu que ainda não vês a Deus, merecerás vê-lo se amas o próximo; amando-o, purificas teu olhar para veres a Deus, como afirma expressamente São João: Quem não ama o seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê (1Jo 4,20).

Ouviste o mandamento: Ama a Deus. Se me disseres: “Mostra-me a quem devo amar”, que responderei senão o que disse o mesmo São João: A Deus, ninguém jamais viu? (Jo 1,18). E para não pensares que está absolutamente fora de teu alcance ver a Deus, o mencionado apóstolo afirma: Deus é amor: quem permanecer no amor, permanece com Deus (1Jo 4,16). Ama, pois, o teu próximo e procura no teu íntimo a origem deste amor; lá verás a Deus o quanto agora te é possível.

Começa, portanto, a amar o próximo. Reparte o pão com o faminto, acolhe em casa o pobre sem abrigo; quando encontrares um nu, cobre-o, e não dês as costas ao teu semelhante (cf. Is 58,7). Procedendo assim, o que alcançarás? Então, brilhará tua luz como a aurora (Is 58,8). Tua luz é o teu Deus; ele é a aurora que despontará sobre ti depois da noite desta vida. Essa luz não conhece princípio nem ocaso, porque existe eternamente.

Amando o próximo e cuidando dele, vais percorrendo o teu caminho. E para onde caminhas senão para o Senhor Deus, para aquele que devemos amar de todo o nosso coração, de toda a nossa alma, de toda a nossa mente? É certo que ainda não chegamos até junto do Senhor; mas já temos conosco o próximo. Ajuda, portanto, aquele que tens ao lado enquanto caminhas neste mundo, e chegarás até junto daquele com quem desejas permanecer para sempre.

"Este é o Filho de Deus!"

Evangelho de Jesus Cristo
segundo João 1,29-34
29No dia seguinte, João viu Jesus aproximar-se dele e disse: "Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo. 30Dele é que eu disse: Depois de mim vem um homem que passou à minha frente, porque existia antes de mim. 31Também eu não o conhecia, mas se eu vim batizar com água, foi para que ele fosse manifestado a Israel".
32E João deu testemunho, dizendo: "Eu vi o Espírito descer, como uma pomba do céu, e permanecer sobre ele. 33Também eu não o conhecia, mas aquele que me enviou a batizar com água me disse: 'Aquele sobre quem vires o Espírito descer e permanecer, este é quem batiza com o Espírito Santo'. 34Eu vi e dou testemunho: Este é o Filho de Deus!"

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

O Verbo assumiu nossa natureza no seio de Maria

Das Cartas de Santo Atanásio, bispo

(Epist. ad Epictetum, 5-9: PG 26, 1058. 1062-1066)
(Séc. IV)

O Verbo de Deus veio em auxílio da descendência de Abraão, como diz o Apóstolo. Por isso devia fazer-se em tudo semelhante aos irmãos (Hb 2,16-17) e assumir um corpo semelhante ao nosso. Eis por que Maria está verdadeiramente presente neste mistério; foi dela que o Verbo assumiu, como próprio, aquele corpo que havia de oferecer por nós. A Sagrada Escritura, recordando este nascimento, diz: Envolveu-o em panos (Lc 2,7); proclama felizes os seios que o amamentaram e fala também do sacrifício oferecido pelo nascimento deste Primogênito. O anjo Gabriel, com prudência e sabedoria, já o anunciara a Maria; não lhe disse simplesmente: aquele que nascer em ti, para não se julgar que se tratava de um corpo extrínseco nela introduzido; mas: de ti (cf. Lc 1,35 Vulg.), para se acreditar que o fruto desta concepção procedia realmente de Maria.

Assim foi que o Verbo, recebendo nossa natureza humana e oferecendo-a em sacrifício, assumiu-a em sua totalidade, para nos revestir depois da sua natureza divina, segundo as palavras do Apóstolo: É preciso que este ser corruptível se vista de incorruptibilidade; é preciso que este ser mortal se vista de imortalidade (1Cor 15,53).

Estas coisas não se realizaram de maneira fictícia, como julgam alguns, o que é inadmissível! Nosso Salvador fez-se verdadeiro homem, alcançando assim a salvação do homem na sua totalidade. Nossa salvação não é absolutamente algo de fictício, nem limitado só ao corpo; mas realmente a salvação do homem todo, corpo e alma, foi realizada pelo Verbo de Deus. A natureza que ele recebeu de Maria era uma natureza humana, segundo as divinas Escrituras, e o corpo do Senhor era um corpo verdadeiro. Digo verdadeiro, porque era um corpo idêntico ao nosso. Maria é portanto nossa irmã, pois todos somos descendentes de Adão.

As palavras de João: O Verbo se fez carne (Jo 1,14) têm o mesmo sentido que se pode atribuir a uma expressão semelhante de Paulo: O Cristo fez-se maldição por nós (cf. Gl 3,13). Pois da íntima e estreita união com o Verbo, resultou para o corpo humano um engrandecimento sem par: de mortal tornou-se imortal; sendo animal, tornou-se espiritual; terreno, transpôs as portas do céu.

Contudo, mesmo tendo o Verbo tomado um corpo no seio de Maria, a Trindade continua sendo a mesma Trindade, sem aumento nem diminuição. É sempre perfeita, e na Trindade reconhecemos uma só Divindade; assim, a Igreja proclama um único Deus no Pai e no Verbo.